Lição de Casa


"(...)
O amor te escapa entre os dedos
E o tempo escorre pelas mãos
O sol já vai se pôr no mar
Saber amar
É saber deixar alguém te amar
..."

Viva La Vida


Ontem fui para o nosso lugar.
O lugar onde nos encontramos, quase que religiosamente, sem marcar.
Mas como é legal saber que você vai estar lá.
Chegar, te cumprimentar e passar o resto da noite esbarrando em você.
Pensando o tempo todo: Qual de nós vai tomar a iniciativa hoje?
Já me acostumei ao ponto de um lugar tão familiar passar a estranho quando você não está.
Ontem foi assim.
Não consegui dançar a nossa música. Fui para área externa e fiquei sentada ao lado do seu coqueiro pensando... Lembrando...
No encontro passado, a mesma música começou a tocar e eu estava na pista sem você. A vontade de você, nesse momento, foi tão grande que não consegui permanecer lá.
Avisei meus amigos, fui pedindo licença paras as pessoas, abri a cortina da saída, levantei os olhos e avistei.
Lá estava você (!),
descendo as escadas.
Ao me ver você disse: "Essa música..."
Te interrompi dizendo apenas: "Eu sei."
E te levei pela mão.
Dançamos a nossa música.
Nos beijamos.
E nesse momento,
inusitadamente,
não me senti mais sozinha.

Educando com Preconceito


Estava eu substituindo uma professora em uma sala com crianças de 5 anos.
Momento do parque. Um dos meninos vem correndo ao meu encontro se queixar:
-Tia, tia, tia! Eles estão puxando a blusa da minha cabeça!
Ele estava brincando com uma blusa na cabeça, encaixava o capuz na cabeça e a blusa toda ficava solta nas costas.
Logo atrás dele, vieram outros dois meninos, e a conversa se inicia:
- Tia, são eles, eles que estão puxando a blusa da minha cabeça!
- Por que vocês estão fazendo isso?
- Ah tia... Porque ele quer ser menina!
Nesse momento o menino com a blusa na cabeça se afastou, como quem não gostou muito do rumo que a conversaia tomar.
Interessada na opinião dos meninos, continuei:
- Por que você acha que ele quer ser menina?
-Porque sim tia! Porque ele já disse pra mim que quer ser menina! Ele fica usando essa blusa na cabeça pra fingir que tem cabelo comprido! Porque ele usa batom!
Com a responsabilidade de educar que todo professor carrega, comecei a me questionar quanto ao que fazer em situações como essa. O que eu poderia responder para esse menino? Eu poderia dizer: "Não, seu colega não quer ser menina. Pare de falar isso por aí e deixe ele brincar como quiser com a blusa!" Ou ainda, eu poderia iniciar uma discussão dizendo: "Talvez ele queria ser menina mesmo, algumas pessoas não se sentem muito a vontade com o corpo que nascem..." E provavelmente esse caminho me levaria à duas reuniões: uma com a direção da escola e outra com as famílias dos alunos.
Sem saber o que fazer e tendo em vista que a turma não era minha, perguntei para o garoto revoltado:
- Você não usa batom?
-Eu não tia! Não sou menina e nem quero ser!
Tirei meu batom neutro do bolso, aqueles de Manteiga de Cacau que a gente usa no inverno, mostrei pra ele e disse:
- Nem esse batom aqui você usa?
Visivelmente contrariado ele respondeu:
- Esse ai... As vezes minha mãe passa em mim, quando tá frio...
- E você acha que vai se tornar uma menina por usar esse batom?
- Não tia...
-Deixe seu colega brincar como ele quiser, certo?
- Tá bom...
Mas nem de longe fique satisfeita com a forma como conduzi a situação. Passei dias pensando nisso. Tive vontade de ir conversar com a professora da turma e tentar perceber nessa conversa se conflitos como esse sempre aconteciam. Assim o fiz. Relatei mais ou menos o ocorrido e ela disse:
- Ah menina... Isso sempre acontece! Ano passado o D. (menino da blusa na cabeça) deixou toda a Secretaria de Educação dessa cidade de cabeço em pé! Ninguém sabe o que fazer com ele...
-E como a senhora resolve os conflitos? Como lida com ele?
- Eu estou trazendo muitas coisas masculinas e deixo a disposição dele. E tiro do alcance qualquer objeto feminino que ele possa querer usar.
- Entendi...
Preciso situar a professora da turma. Ela tem muitos anos de docência e é adepta de uma doutrina religiona muito rígida.
Esse fato me fez, ainda, ter vontade de conversar com outras pessoas sobre o assunto. Fiquei pensando se levaria ou não a questão para a sala de professores da minha escola. Eu estava quase introduzindo o assunto quando uma das professoras nos chamou a atenção para alguns desenhos que estavam na parede:
- Olha meninas a professora dessa sala está trabalhando profissões! Tem vários desenhos de Veterinário e Veterinária.
Outra professora notou:
- Ali tem um desenho de Paisagista!
- Ah é? Mas é de uma menina né?
Eu, mais que depressa:
- Por que tem que ser de uma menina?
A docente sem saber direito o que responder... Resmungou:
- Ah gente... Preconceitos...
Ninguém disse mais nada. As outras seis professoras que estavam na sala não se manifestaram... E então, por hora, desisti de falar sobre o menino da blusa na cabeça.

Linda Rosa Juvenil


E quando percebi... Havia acontecido EXATAMENTE como imaginei:
A mãe dela me ligou e marcamos o encontro no Centro da cidade.
Fui encontrá-los, conversamos um pouco e logo voltei pra casa com ela.
Minha pequena... Que agora estava tão maior...
Uma ex "aluna"... Que durante o ano passado, juntamente com todos seus outros coleguinhas, me manteve em pé.
2008 não foi um ano fácil, e sobrevivi graças a eles.
Hoje são lembranças ternas, que ao revividas na memória um sorriso automático surge.
Foi uma tarde agradável. Conversamos. Brincamos. Ela conheceu meus gatos (e matou sua curiosidade finalmente!), desenhou, mostrou que já sabe escrever o próprio nome... Espertíssima!

Aconteceu exatamente como em meus devaneios e a melhor parte é que eu não fiz nada para que assim fosse. Apenas atendi o celular e concordei com o encontro.
Fiquei pensando que os outros departamentos da minha vida também poderiam funcionar assim... Que tudo fosse como desejo e sem precisar mover uma palha.
Acho que estou cansada.

Equador


É como costumo dizer, não sou espírita, mas se assim fosse diria que a conheço de vidas passadas.
Não tenho idéia de quantas vidas eu já vivi, mas tenho certeza de que em alguma delas (ou em todas elas) ela esteve presente.
Ah... Esteve sim... E exercendo papel importante.
Importante o bastante para que eu não a esquecesse.
Algo marcante foi vivido em algum desses enredos passados. Minha certeza vem daquele dia.
O dia em que a "reconheci" no momento em que botei os olhos nela. Tão novinha... Cabelo encaracolado, uma blusa verde, olhos pequenos e o sorriso de sempre.
"Lembra tanto alguém... Será que a conheço de algum lugar?"
Nessa noite a fitei uma vez, somente esta vez. Não fomos apresentadas e nem seu nome eu soube. No entanto, jamais esqueci.
Nos conhecemos de fato alguns anos depois e como se nenhum tempo tivesse passado, a noite da blusa verde voltou-me à memória.
Nem ela e nem a pessoa que nos apresentou recordavam-se da tal noite (muito menos da blusa), mas eu sim.
Finalmente nos conhecemos. As semelhanças foram surgindo e um carinho instantâneo veio forte.
Em uma tarde de conversa (agradável sempre) veio uma surpresa boa: a sensação de reconhecimento era recíproca =)
Mesmo podada pelo curto tempo juntas a amizade cresceu.
Uma linha impede que a convivência seja maior, mas isso não me entristece.
Estou esperando.
Amadurecimento, mais proximidade, liberdade, coragem... Tantas coisas...
Não existe pressa.
Standby.